quarta-feira, 10 de junho de 2009

IGREJA PAROQUIAL DA PONTA DO PARGO
ARCIPRESTADO DA CALHETA
DIOCESE DO FUNCHAL
CATEQUESE



Festas religiosas populares



Estamos em plena época das festas dos «santos populares», S. António, S. João e S. Pedro, e início de outras festas religiosas também chamadas populares. Essas festas movimentam multidões, são frequentemente um quebra- -cabeças para os párocos e tema de notícia nos meios de comunicação social do Verão. Vale a pena reflectir nesse tema.

Há um primeiro equívoco que é necessário desmontar desde já, o de falar de «religião popular», como se uma religião nascesse de movimentos populares e desejo de convívio. «A história das religiões ensina que a base de qualquer religião, como a base de qualquer cultura, é por definição de origem sábia e não popular». A designação de populares, aplicada aqui a certas manifestações religiosas, deriva do propalado afecto do povo por essas festas tradicionais, mas esse sentimento é complexo.

Por vezes, nem as pessoas sabem discernir claramente donde lhes vem «aquela paixão pela festa»: se é um verdadeiro amor ao santo, se é antes o sentimento bairrista e desejo de congregar ali os amigos e emigrantes, se é o desejo de organizar um convívio mundano onde cabem certas liberdades, ou se essa paixão por aquele local inclui o prolongamento de uma festa pagã. É que no local onde hoje se encontra a capela do santo pode ter estado outrora um ídolo, uma fonte, um penedo, ligados ao culto da natureza ou ao calendário do ciclo agrário, e que os posteriores nomes dos santos e datas cristãs não conseguiram abafar. É o caso do S. João, colocado no solstício do Verão, como o Natal foi posto no solstício do Inverno: tanto as fogueiras do Verão como o braseiro do Natal são restos das antigas festas pagãs do sol integrados nas festas cristãs. Algo semelhante se pode dizer das festas de Todos os Santos e dos Fiéis Defuntos de 2 de Novembro que, em alguns países, cristianizaram a Samain celta ou convívio dos vivos com os mortos que se celebrava ao chegarem as sombras do Outono.

E há casos de procissões cristãs sobrepostas a outras pagãs do calendário romano, como «as ladainhas de S.Marcos» que se rezavam no dia 25 de Abril para encobrir as «rubigália» ou preces que os antigos romanos dirigiam a Ceres, deusa romana da agricultura, contra as larvas que atacam as primeiras culturas da Primavera.

Numa palavra, a organização do calendário cristão teve um duplo objectivo: celebrar os factos da história da salvação e os heróis cristãos que são os santos, e, ao mesmo tempo, fazer a evangelização do espaço e do calendário, expulsando os ritos pagãos. Em alguns casos, as festas cristãs criaram uma festa de origem, mas noutros casos tiveram também uma função purificadora.


Actualmente, para encontrar originalidades locais que possam atrair os turistas e fazer frente à monotonia da globalização, as associações locais, as escolas e, por vezes, as autarquias, ressuscitam restos de festas pagãs e incluem--nas no programa das festas cristãs, misturando nas festas cristãs as curiosidades arcaicas do paganismo ou vanguardismos comerciais.

Os pastores das comunidades eclesiais e os próprios membros das comissões das festas devem estar devidamente informados da origem das festas e atentos à ambiguidade do sentimento religioso e cultural das mesmas para não serem surpreendidos pela agitação de grupos da última hora e, pior, agentes da confusão. Contudo, não é prudente extinguir sem mais as referidas festas religiosas apesar dos seus riscos, pois elas aproximam o povo, alimentam o espírito de comunidade e podem ser veículo de evangelização.


A norma da Igreja é que a piedade cristã se alimente na fonte da liturgia que celebra os grandes acontecimentos históricos da salvação, e que as festas religiosas populares sejam iluminadas por aquelas festas litúrgicas de cada tempo, essas, sim, dignas de todo o empenho pastoral e verdadeiras fontes de água pura.